Fim de uma era: Lanches Clayton agora aceita pix, débito e crédito

 O estabelecimento passou quase 60 anos recebendo apenas pagamento em dinheiro vivo

Foto: James Martins / Metropress

Por: James Martins no dia 02 de setembro de 2024 às 08:05

Mais um ciclo se encerra: após quase 60 anos fazendo operações somente em dinheiro vivo, a lanchonete de Clayton, no Terreiro de Jesus, n° 7, agora também aceita pix, débito e até crédito. "Crédito também já é demais! Esculhambou, vai perder a identidade!", brinca o artesão Raimundo dos Santos, cliente antigo, ao ser informado da novidade. Já o proprietário argumenta com a lógica: "Não dava mais para manter daquele jeito. Demorou até demais. E a verdade é que nossa identidade não está na moeda nem na forma de pagamento, e sim no lanche de qualidade e no bom atendimento", diz o próprio Clayton, cujo nome está gravado na placa.

Segundo ele, a medida já foi implantada há algum tempo, só não está ainda devidamente divulgada. "Meu gerente não diz às pessoas, insiste em receber só em dinheiro. Mas, pela manhã, quando estou aqui, não tem erro. Na verdade a falha é minha mesmo, que ainda não botei um anúncio na parede", diz. Na realidade, o aviso antigo, sobre pagamento apenas em espécie é que permanece colado no estabelecimento — testemunho de um longo e romântico período.

O anúncio desaforado é agora apenas testemunha de um outro ciclo... 

"Eu já vi muita gente se atrapalhar aqui, passar vergonha, achando que iria passar no débito e descobrindo, depois que comeu, que só aceita dinheiro", diz Raimundo. Mas Clayton destaca que, nesses casos, a situação sempre foi resolvida com diplomacia e fé na humanidade: "Paga depois".

A praticidade do pix agora também serve para pagar o delicioso aipim com ovos...

Fundada em 30 de março de 1964, em plena articulação do famoso Golpe Militar que iniciou a ditadura, Lanches Clayton é frequentada por anônimos e personalidades, dentre as quais Clarindo Silva, Alberto Pitta, Mestre King Kong. Mesmo com o novo sistema de pagamentos, alguns ainda recorrem ao fiado, com anotação no caderninho.

Dentre os destaques do cardápio, o aipim é o carro-chefe: seja puro, com manteiga, com ovos ou com ensopado de carne. Mas saem também sanduíches, salgados, bolos, banana da terra cozida, cuscuz, ovos cozidos, sucos diversos, refrigerantes e uma providencial cervejinha para desanuviar as ideias. Um dos pontos mais autênticos do Centro Histórico de Salvador.