A Argentina investigou, julgou e puniu torturadores de sua ditadura, enquanto o Brasil tomou um caminho oposto
Foto: Reprodução/Acervo Nacional
O Ministério dos Direitos Humanos, comandado por Silvio Almeida, cancelou uma solenidade marcada para 1º de abril em memória dos 60 anos do Golpe de 1964. A decisão ocorreu após uma orientação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O mandatário afirmou que prefere não ficar remoendo as consequências da ditadura porque isso “faz parte do passado” e é preciso “tocar o país para frente”. A decisão, no entanto, não foi vista com bons olhos e fez reacender o debate sobre a forma como o Brasil construiu a memória e a narrativa de um regime que deixou ao menos 434 mortes e desaparecimentos, segundo o relatório da Comissão Nacional da Verdade (CNV).
A maneira como o país lidou com o fim da Ditadura Militar repercute até hoje no imaginário social, a ponto de grupos pedirem intervenção militar em 2022. Quem faz essa avaliação é o ex-membro da Comissão da Verdade do Estado e doutor em Comunicação pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), Joviniano Neto. Ao Jornal Metropole, ele criticou a decisão de Lula e comparou a relação de outros países da América do Sul com seus regimes militares.
“A ditadura militar no Brasil terminou de um modo diferente do que aconteceu na Argentina, por exemplo, que foi depois de uma derrota militar. Foi diferente, também, do Chile, onde a ditadura foi derrubada com um plebiscito. Aqui, tivemos uma transição meio negociada e os militares até hoje não reconheceram os erros, o que é um problema”, argumentou.
O resultado da memória brasileira criada até aqui refletiu não só nos pedidos de intervenção. Joviniano cita ainda como exemplo um outro episódio recente: o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016. “Quando um deputado, que posteriormente foi eleito presidente da República, prestou homenagem ao coronel Brilhante Ustra, reconhecido como o maior torturador da história brasileira”.
“Durante a transição democrática liderada por Tancredo Neves, houve uma tendência de evitar olhar para o passado, buscando cicatrizar feridas e avançar. Essa mesma abordagem foi adotada por líderes posteriores, como Lula”, destacou em entrevista à Metropole. Aarão, no entanto, alerta que discutir o passado não garante que os problemas não retornem.
“A dificuldade para lidar com o conjunto destes problemas o obriga a evitar vários deles, que podem resultar em atritos, em aprofundamentos, dificuldades e por aí fora. [...] Podemos entender que ele [Lula] tem dificuldade de exercer a posição pessoal quando está no exercício de uma atividade não-pessoal, que é a Presidência da República”, declarou.
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